quarta-feira, 18 de maio de 2011

Esquerda e centro-esquerda na Argentina e no Brasil


O surgimento, na Argentina, da Frente de Esquerda e dos Trabalhadores (FIT) deveria estar gerando um importante debate na esquerda brasileira. A unidade entre o PO (Partido Obrero), o PTS (Partido dos Trabalhadores Socialistas, integrante da FT-QI, representada no Brasil pela LER-QI), IS (Esquerda Socialista) e outras organizações para disputar as eleições argetinas (nacionais, estaduais e munipais) pode ser um importante ponto de apoio para a organização política da classe operária daquele país e do chamado “sindicalismo de base”, que tem enfrentado, a partir das assembléias e comitês de fábrica, a política da patronal, da burocracia sindical e do próprio governo Kirchner. Apesar desse importante ativismo operário anti-burocratico que surgiu nas principais concentrações operárias da Argentina, o apoio ao governo de Cristina Kirchner ainda é majoritário (vinha em níveis baixos, mas se recuperou com a morte do seu marido no ano passado). As alternativas de oposição burguesa (seja a UCR do ex-presidente De La Rua ou setores mais a direita como o prefeito de Buenos Aires Macri) vivem uma crise ainda maior do que a da oposição brasileira e suas divisões internas a impedem de ter uma candidatura unificada. Isso apesar da estabilidade política do governo ser mais débil na Argentina do que no Brasil.

O acordo das organizações de esquerda surgiu da necessidade comum de se defender de uma nova lei eleitoral proscritiva (além de outras coisas, haverão primarias em agosto e os partidos que não alcançarem um piso de 1,5% dos votos não vão poder lançar condidato nas eleições pra valer que serão em outubro), mas tem todas as condições de se tonar um ponto de apoio para uma ofensiva ideológica e organizativa da esquerda classista argentina. Apesar das importantes diferenças que separam os partidos que constituem a FIT, as principais organizações que o compõe defendem um programa de independência de classe que pode ser uma referência e uma alternativa para os trabalhadores.

As diferenças com a Frente de Esquerda que se formou em 2006 no Brasil, ou com a que não chegou a se formar em 2010, são gritantes. Na Argentina, não são todas as organizações de esquerda que estão no FIT. Outras forças que se reivindicam de esquerda, como o MST ou o PCR, se aglutinam em torno da candidatura centro-esquerdista do cineasta Pino Solanas, do Proyeto Sur. A primeira derrota desta política foi dado pelo próprio Solanas, quando esse retrocedeu e retirou a candidatura a presidência para se lançar à prefeitura. No site do PSOL, não a toa, podemos ler um artigo do MST, em que dizem que o Proyeto Sur “é a versão 'a la argentina' de uma organização de novo tipo como o PSOL no Brasil e o NPA na França. Tem algo em comum com o que foi a Frente Ampla e o PT (brasileiro) em suas origens. É uma organização anti-imperialista e inimiga dos grandes grupos econômicos, com apelo forte democrático.” Apelo democrático e anti-imperialista, nenhum apelo classista e na prática uma política de conciliação com a burguesia.

Em Buenos Aires, está selada uma aliança entre Pino Solanas e o mal chamado Partido Socialista, cujo principal referente é Hermes Binner governador do estado de Santa Fe, que fez parte das forças que apoiavam o governo De La Rua (aquele mesmo que foi derrotado pelas massas em 2001) e que a nível nacional negocia uma aliança com a UCR de Alfonsín (filho do primeiro presidente argentino pós ditadura). Em certos aspectos, o programa do Proyeto Sur defende pontos mais de esquerda que o programa defendido por Heloísa Helena em 2006, como a nacionalização das empresas privatizadas ou a convocação de uma assembléia constituinte para “reformar a constituição”. Apesar disso, como diz a organização da LIT (página 5 do seu primeiro jornal), o PSTU/Argentina: “Pino Solanas também defende os interesses dos capitalistas. A tal ponto que ainda não descartaram entrar numa frente com radicalismo (UCR). É uma variante capitalista de centroesquerda: defende o pagamento da dívida externa, dizendo que é preciso investiga-la e não pagar sua parte fraudulenta; dizem que é preciso que dar os recursos naturais aos capitalistas nacionais, e não ao controle dos trabalhadores; não luta contra a precarização, nem contra os fechamentos das fábricas.” Cada uma dessas críticas feitas a Pino Solanas poderia ser estendida, no Brasil, ao programa do PSOL, mais particularmente às posturas defendidas por Heloisa Helena e pelo MES/PSOL. A LIT precisa esclarecer a vanguarda brasileira e latino-americana sobre o por que na Argentina atua corretamente apoiando uma frente classista, rechaçando a unidade com a centro-esquerda, enquanto no Brasil, onde o PSTU tem um peso real, se nega a constituir uma frente classista, nega a filiação democrática a LER-QI e dilui suas bandeiras atrás do programa centro-esquerdista do PSOL.

Em função dessa política do PSTU, uma das grandes vantagens da configuração de forças que se apresenta nas eleições Argentinas em comparação ao que tem se dado no Brasil é que graças a unidade lograda com o FIT as forças classistas aparecerão unificadas e claramente diferenciadas das alternativas de centro esquerda. Toda a esquerda classista da América Latina deve apoiar o FIT e tirar as conseqüências para seus próprios países, se consideram que “a esquerda tem que oferecer uma opção política independente nas próximas eleições nacionais e estaduais, e não ir como apoiadora dos blocos capitalistas tradicionais, sejam esses do governo kirchnerista ou da chamada oposição, nem se diluir em uma centroesquerda cujo programa é a defesa de interesses sojeiros e industriais.” (Manifesto de intelectuais em apoio ao FIT que já conta com centenas de assinaturas)

Como disse Cristian Castilho, candidato a vice-presidente pelo FIT e militante do PTS na conferência de imprensa de lançamento do FIT, “ésta es la izquierda que va de frente contra las patronales, el gobierno, la oposición sojera y la burocracia sindical, la que ha jugado un papel relevante en las principales luchas protagonizadas por la clase trabajadora en el último período, como en ferroviarios, en Kraft, en el subte o en Zanon”.

Para uma análise mais profunda de como o PTS encara sua participação no FIT, ver, em espanhol,
UNA OPORTUNIDAD PARA LA ORGANIZACIÓN POLÍTICA DE LA VANGUARDIA OBRERA INÉDITA DESDE HACE DÉCADAS

Nenhum comentário:

Postar um comentário